Diário de Campanha

O chapéu faz o homem

Gosto de pessoas que têm bom gosto.

Pessoas de bom gosto geralmente são inteligentes.

Pessoas inteligentes normalmente são boas pessoas que fazem o bem.

Fazer o bem é bom. Todo mundo ganha.

Que faz o bem combate os grandes males do mundo: a burrice, o egoísmo, a ingratidão,  a inveja.

Gosto de quem faz o bem. São pessoas inteligentes e “fina porcelana”. Gosto de andar com e ser amigo de pessoas assim.

Quando você não conhece uma pessoa e quer conhecer, preste atenção aos quadros que ela tem na parede e aos livros que tem na estante. Quadros/telas/obras de arte/decoração e livros dizem muito sobre uma pessoa.

O lixo da pessoa também, às vezes fala até mais, até de mais.

Há muitos anos, quando eu morava em Paris, fui à loja Virgin, na avenida Champs-Elysées, comprar uns CDs. A loja não existe mais.

(Ops! Gol do Neymar contra a Colômbia pelas eliminatórias da Copa da Rússia, em Manaus, hoje, agora, dia 6 de setembro de 2016, 23h22. 2X1 pra nós)

Bom, voltemos à Virgin, em Paris.

Franceses e Japoneses adoram Jazz e Bossa Nova. Eu também.

Então, na Virgin, flagrei uma liquidação de CDs de jazz. Tinha muita coisa a preços ótimos. Apenas um detalhe: as músicas, títulos, intérpretes estavam em japonês. Meu mandarim, japonês de Pequim, anda meio enferrujado. O que fiz? Comprei pela capa. Duas capas lindas, desenhos, aquarelas, duas mulheres. Pensei: um disco com uma capa bonita assim, só pode ser e ter coisa boa. Acertei em cheio. Era de “My Funny Valentine” pra cima. Bom gosto na capa, boa música.

Ainda em Paris, morei em vários bairros, dos mais chiques aos mais feios. Um dos chiques era o 16. Em Paris, os bairros atendem por números.

Pois bem, eu morava humildemente, mas num prédio chique, de uma rua chique, a Michel Ange, no 16.

Vivia no último andar, nos chamados “chambres de bonnes” (quartos de empregada) transformados e adaptados em apartamentos – geralmente para estudantes.

Paris não tem mais empregadas domésticas que dormem no emprego. Nem empregadas domésticas. No máximo, diaristas que ganham muito bem. Pois bem, pra não perder dinheiro, os quartos de empregada viraram apartamentos. Cada apartamento chique tinha um quarto de empregada no último andar.

No primeiro andar, morava uma família como o prédio e a rua: chique. A família Nègre! Gente fina e como diz o ditado, gente fina é………….A mesma coisa!

A família Nègre era composta por marido, mulher e dois filhos lindos e louros, uma menina e um menino, acho. Casal jovem, mas muito esnobe, no sentido Boris Vian. Nunca me cumprimentavam, olhavam com olhar superior e de desdém. “Brasileiros…”. Faziam altas festas e jantares, dia seguinte, no lixo deles, só tinha garrafa de champagne e de ótimos vinhos.

Certa feita, fui depositar meu humilde lixo (separado e a reciclar) no devido lugar. Olhei para o lado e, vazando de um grande saco preto, percebi várias fitas de vídeo cassete. Artista plástico, disfarçado de acumulador, claro, peguei todas as fitas. Vi que eram da família Nègre porque junto às fitas tinha um monte de revista e envelopes com o nome Nègre. Tudo bem!

Peguei as fitas que tenho até hoje e subi ao meu humilde claustro. Quando coloquei as fitas no aparelho de vídeo cassete… Só filmes pornô, suecos, em preto e branco, anos 70.

Não pude evitar a imaginação do casal esnobe, depois das festas e champagne, indo pro quarto e apreciando as fitas para pintar um clima. E o que faziam durante o clima… Desde então, ao cruzar seus olhares esnobes eu via o casal em todas as posições dos “artistas” das fitas suecas… É aquela velha propaganda da Pinga São Francisco: rico também bebe cachaça.

Desde então, pelo lixo, conheci um pouco do casal. Bebia champagne como poucos e transava como simples mortais. Aquela música do Cazuza, “você caga e anda como todo mundo…”.

Também em Paris, numa exposição, conheci e me apaixonei pelo trabalho do artista plástico alemão, Max Ernst (1891 – 1976). Surrealista, dadaísta. Fã de Van Gogh e marcado pelo horrores da Primeira Guerra Mundial. Um grande artista. Na Segunda Guerra Mundial, perseguido, exilou-se nos Estados Unidos e morreu em Paris. Belas trajetória, vida e morte.

Pois bem. Domingo passado, em São Paulo, nosso Gabriel Azevedo esteve com o “Adamastor da Política” – como o definiu Antônio Anastasia – meu eterno presidente, Fernando Henrique Cardoso, em seu apartamento. Assim que voltou a Belo Horizonte, Gabriel, pra me matar de inveja, mandou umas fotos. Numa delas, na sala, pude confirmar o bom gosto que sempre desconfiei em FHC. Tudo “impeccable”, dos móveis aos quadros nas paredes.

No lixo de FHC deve ter garrafa de vinho francês. Na estante, o único livro que consegui identificar foi um sobre Max Ernst.

ps: gosto e acredito em pessoas que gostam e frequentam pessoas que gostam de Max Ernst.