A primeira verdade: a gente só dá valor quando perde. Ou dá mais valor quando perde, ou quando descobre o valor. Ou quando comparamos os valores do que tínhamos e do que temos, do que sobrou. Isso não serve só para mulheres perdidas.
A segunda verdade: quando você prova o A não quer voltar para o B. Provar o A, acostumar-se ao A e ter que se contentar com o B, é osso punk. Perguntem ao Eike… Trocar a Luma pelo Mantega é soda! Isso não serve só para os vinhos perdidos.
As duas verdades servem para o transporte público. Sei que o paladar de um vagão não é o mesmo daquela das mulheres e dos vinhos, mas transporte é qualidade de vida e qualidade de vida ajuda a apreciar mulheres e vinhos Classe A.
Estamos na semana da Mobilidade. Dia 22 de setembro foi o Dia Mundial Sem Carro. Pra mim, neste sentido, todo dia é 22 de setembro. Vi uma entrevista com o figuraça Paulo César Pereio, há muito tempo já. Ele é gaúcho, morou muitos anos no Rio e acho que está radicado em São Paulo. Ele dizia que há anos, não tirava o carro da garagem… Usar carro em São Paulo, Rio e Belo Horizonte não é para principiantes de primeira viagem, mas para correligionários de Masoch.
Não é o caso do nosso Gabriel em caso, o Azevedo que escreveu: “Hoje é dia mundial sem carro. Não tenho nada contra carros, mas prefiro viver sem depender de um. Sei que não são todos que conseguem isso, mas motivo muito quem conheço a tentar. O relevo de Belo Horizonte não ajuda. Respeito quem sua a camisa para pedalar, mas como uso terno na maior parte do tempo, faz muito calor e estou sempre com mil compromissos não consigo chegar pingando nas agendas. A minha solução foi a bicicleta elétrica. Quem nunca utilizou uma ficaria impressionado. Com raríssimas exceções de ladeiras na cidade, eu vou a todos os lugares. Vou rápido, driblo o trânsito e sinto que aproveito a vida urbana muito melhor. Acho mesmo que muita gente poderia fazer o mesmo. O nosso futuro seria muito diferente. Uma dezena de amigos já fizeram essa opção. Eles duvidaram no começo e estão muito satisfeitos hoje! A maior parte dos lugares que visito no mundo são incríveis por conta desse avanço. E acho que a gente também deve avançar. Fica essa reflexão. Não tem nenhum ciclista desvairado aqui que quer forçar todo mundo a abandonar seus carros e sofrer nesse transporte público sofrível que temos. Aqui só tem um cara que quer fazer diferente e quer fazer diferença. Pedalar faz”.
Posso assinar embaixo. E não é agora, ele usa bicicleta há muito tempo. Bicicleta e energia solar são duas coisas que me lembram o Gabriel. A Jamaica, conhaque e charutos também, mas isso não vem ao caso.
Gabriel resumiu bem o problema e a solução, mas entre as duas coisas tem muito mais.
No meu caso, o “problemão” é ter vivido muito tempo em Paris, onde você não anda mais de 500 metros sem ver a estação de uma das 14 linhas de metrô. São Paulo, nossa maior cidade, tem quantas? Três, três e meia, quatro, seis? E o detalhe de São Paulo são as linhas pequenas. O segredo do metrô são linhas longas e que se cruzam, senão…
Paris tem 2,3 milhões de habitantes. São Paulo, mais de 11 milhões. Precisa falar mais? Precisa: BH tem 2,5 milhões e quantas linhas de metrô? Nenhuma. O que temos aqui é trem de superfície e temos que andar muito, pegar ônibus lotados e nojentos para chegar aos trens.
Vou parar por aqui porque sem metrô não há solução para trânsito em nenhuma grande cidade do mundo. Por que não temos metrô, se a vizinha Buenos Aires tem há mais de 100 anos? Mesma coisa que perguntar qual o sentido da vida…
Falemos pois de bicicleta. O Gabriel disse uma coisa importante, o relevo de BH não ajuda. E outra, ele mora no centro. Penso em quem mora nos subúrbios de BH. No Rio e em São Paulo, a população leva, em média, três horas no trânsito. Um crime!
Outra verdade do Gabriel: nosso sofrível transporte público, navio negreiro. Ando de ônibus e até me machucar seriamente dentro de um deles, já me aconteceu, entre arrancadas ou freadas bruscas.
Bicicleta é apenas um “plus”, quase um luxo. E quando chove ou faz calor senegalês de derreter catedrais panamenhas?
Bicicletas ajudam. Desafogam o trânsito (não na China ou no Vietnã, pelo contrário), mas não resolvem. São boas para pequenas distâncias. Andar de bicicleta em Paris (ouvindo Yves Montand cantando “La Bicyclette”) ou no Rio de Janeiro (ouvindo Raimundos: ” Eu queria ser o banquinho da bicicleta pra ficar bem no meio das pernas e sentir o seu ânus suar. Eu queria ser, a calcinha daquela menina pra ficar bem perto da vagina e às vezes até me molhar), apreciando a vista é um privilégio.
Em Paris deu certo alugar bicicletas e carros elétricos que a gente pega e deixa em certos pontos. Carros, só para parisienses, bicicletas para qualquer mortal. Nunca usei, por causa do vinho que não bebo com moderação; não gostaria de ser atropelado em Paris ou nenhum outro lugar. Esportes “radicais” não rimam comigo. Com minha primeira bicicleta, presente de Natal, caí, enfiei o pé num canteiro cheio de coroa de Cristo, é assim que se chama? Nem queiram saber o que o espinho fez no peito do meu pé depois de atravessar o tênis de couro. Era uma Caloy preta.
É difícil voltar de uma Paris cheia de metrô para uma BH sem nenhum. É osso acostumar-se com a mobilidade de Paris e enfrentar a paralisia de BH. E olha que não precisei perder, para dar valor. Eu era feliz e sabia.
Voltemos ao Rio, sem piadinhas sobre a ciclovia do Eduardo Paes. São 450 km de ciclovias ou ciclofaixas, lotadas de problemas como a disputa de espaço com os carros e o risco de assaltos.
O Gabriel do Rio já foi o Fernando Gabeira que, na zona sul maravilha, fazia campanha para prefeito, pilotando sua bicicleta e usando chinelos…
Pra terminar, repito, bicicletas ajudam, a solução é o metrô e olhe lá! Greve de metrô em Paris, desejo nem ao Lula. Ou estou mentindo? E Metrô e ônibus têm que ser fartos e confortáveis. Em Paris (quase) todo mundo usa um ou outro. Já peguei ônibus com a linda Fanny Ardant e sua linda filha. Fanny Ardant no Brasil seria como… sei lá, uma Fernanda Montenegro.
ps: Elejamos o Gabriel e sua bicicleta, quando ele for governador, a gente exige o metrô.